A
crise que se apresenta neste momento, no país e no mundo, deve ser observada do
ponto de vista da economia e da política sob a ótica dos trabalhadores. É com
este objetivo que o FAÍSCA, em forma de um breve ensaio, vem abordar de maneira
sucinta - mas nem por isso superficial - o desenvolvimento da crise do capital.
A
burguesia tenta por todos os meios esconder da população, em particular dos
trabalhadores, quais são as principais e mais profundas causas da crise. E não
poderia ser diferente. Abrir o jogo e dizer claramente os reais motivos da
crise, desmascararia o capital frente às massas de explorados e oprimidos,
pondo-se a nu todo o sistema predatório da ordem do capitalismo. Assim,
prefere-se por a culpa na corrupção, na inflação, no clima, enfim, em consequências
e efeitos, não nas causas e raízes que deram origem a difícil situação em que
encontra-se o Brasil e o mundo.
A
verdade é que estamos vivendo um período de profunda crise do sistema
capitalista. Uma crise que, ao contrário das antigas crises de superprodução,
tem até o momento um caráter permanente, pois ela brota da própria lógica do
capitalismo, sob a necessidade de um crescimento econômico infinito em um
planeta de recursos finitos. A busca incessante e irracional pelo lucro, que
gasta recursos preciosos na produção de armas de destruição em massa ou
mercadorias projetadas para se tornarem lixo em poucos meses, não leva em
consideração as necessidades humanas ou o valor de uso da sua produção.
Além
destes problemas, o capital tem enfrentado sérias dificuldades na sua
reprodução. Essa controvérsia dá-se justamente por mais uma de suas
contradições intrínsecas, que surge da necessidade de revolucionar as forças
produtivas para aumentar a produção e diminuir a mão de obra necessária. A
partir deste movimento, o capital lançou e lança, cada vez mais, fora do
processo produtivo, milhões de trabalhadores em todo o mundo, gerando uma
diminuição no número de consumidores potenciais de suas mercadorias.
Entre
o pós Segunda Guerra Mundial e a eclosão da crise na década de 70 do século
passado, quando as taxas de lucro obtidas eram altas o suficiente, o capital
permitiu ao Estado suavizar algumas de suas contradições nos países centrais do
sistema capitalista, e os trabalhadores desses países puderam experimentar um
período em que as suas condições de vida melhoraram significativamente. Porém,
este período há muito tempo se foi e os Estados não tem mais sido capazes de
remediar os efeitos colaterais da crise do capitalismo. Em todo mundo vemos uma
piora significativa na qualidade de vida dos trabalhadores, com um grau de
exploração cada vez mais acentuado, e a sociedade cada vez mais dividida entre
uma minoria de super-ricos e uma maioria esmagadora de pobres.
A
crise mostra-se longa, crônica e, até o momento, irreversível. Não é uma crise
linear, como uma linha reta. Ela se desenvolve em ciclos e durante o período de
sua manifestação houve épocas de recessão intercalada por épocas de
crescimento. Os movimentos da crise a partir de 2008, ano em que se viu o
estouro da bolha imobiliária nos EUA, com efeitos expansivos por toda a
economia global, demarca um novo período no processo da crise do capital.
O
acirramento das contradições do sistema capitalista, que denominamos CRISE,
embora se dê em escala global, manifesta-se de forma diferente em alguns países
e, ao mesmo tempo, de maneira semelhante em um determinado conjunto de países
assim como as medidas de contenção ou tentativas de resolução dessas
contradições. Todavia, o caminho que todos os países em crise econômica
percorrem igualmente é a precarização da vida dos trabalhadores.
Em
países como os EUA, Espanha, Irlanda, Grécia e Portugal, dentre outros, os
Estados, cumprindo a função que lhes cabe, socorreu as instituições financeiras
(bancos, fundos de pensão, seguradoras, etc.) e grandes empresas
transnacionais, jogando sobre os trabalhadores as contas a serem pagas. Proliferou-se por todo o mundo a precarização
das condições de vida dos trabalhadores, o desemprego, o arrocho salarial,
centenas de milhares de famílias despejadas das suas casas e obrigadas a
viverem em moradias improvisadas.
O
Brasil sofreu de forma diferente com a crise. Com a recessão dos principais
compradores internacionais de suas matérias primas (commodities), tais como,
minério de ferro, soja, carne e outros mais, a política econômica do governo
voltou-se para o mercado interno com o intuito de incrementar o consumo de bens
duráveis (automóveis, eletrodomésticos, eletroeletrônicos, etc.) e
financiamento do setor imobiliário. Este objetivo foi alcançado,
momentaneamente, através do incentivo ao crédito, isenção fiscal e a construção
de obras de infraestruturas (ferrovias, hidrelétricas, portos, aeroportos),
além das obras faraônicas de eventos como a Copa do Mundo e as Olimpíadas. É o
chamado Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), que se mostrou um desastre na
sua execução e fonte ininterrupta de desvio de verbas e corrupção desenfreada.
O
objetivo das políticas foi alcançado por algum tempo. A expansão do capital foi
garantida, bem como ocorreu uma melhora nos índices de emprego, habitação e
salário. Entretanto, sem uma retomada da economia mundial e ainda amargando a
queda dos preços e das vendas das commodities, as políticas econômicas perderam
a sua capacidade de manter a atividade econômica nos patamares anteriores a
2008, ou em relação aos anos de 2010 e 2011.
Nos
últimos dois anos, o atual governo tem se visto incapaz de acelerar a atividade
econômica, pois as medidas levadas a cabo como: isenções fiscais, investimento
em infraestrutura, incentivo ao crédito com a redução de juros, financiamento
do setor imobiliário via Caixa Econômica Federal, com baixas taxas de juros,
acabaram causando um forte desajuste nas contas do Estado, inviabilizando a
continuidade das medidas que garantiam a acumulação de capital. Este desajuste
causou um aumento da dívida estatal, bem como inviabilizou a formação do
superávit primário (economia de recursos estatais para pagamento de juros das
dívidas interna e externa) o que causou uma forte pressão do setor financeiro
para a realização de um ajuste fiscal (redução drástica nos gastos públicos –
saúde educação, habitação, transporte, direitos trabalhistas, etc.) o que está
levando ao aprofundamento da crise que se manifesta principalmente com
desemprego, inflação, arrocho salarial.
A
precarização das condições de vida dos trabalhadores ocorreu em todo o mundo e
desembocando em uma série de manifestações durante os últimos cinco anos, desde
a “Primavera Árabe” até as Jornadas de Julho no Brasil. A juventude e os trabalhadores
manifestaram a sua insatisfação com a ordem presente e as perspectivas sombrias
para o futuro.
Durante
todo o período de manifestações contra o aumento das passagens de ônibus em
2013 e em 2014 contra a Copa da FIFA no Brasil, o PT, seus militantes, além de
partidos e sindicatos aliados, se uniram para criminalizar esses movimentos
espontâneos e legítimos, e com uma forte repressão o objetivo foi alcançado. O
enfrentamento do movimento de massas com as forças do Estado e a intransigência
violenta desse diante das justas reivindicações dos manifestantes provocou um
grande desgaste na imagem do PT. Isso foi bem aproveitado pelas forças de
oposição, que passaram a atribuir aos petistas a responsabilidade de todos os
males existentes, e com esse discurso conseguiram uma grande quantidade de
votos, conquistando muitas cadeiras no congresso e por pouco não lograram tirar
o PT da presidência. O que se viu depois da eleição foi o aumento das tensões
entre as frações governistas e oposicionistas, sendo que esta última tem
reunido uma quantidade bastante heterogênea de adeptos, que inclui, inclusive,
fascistas e saudosistas da ditadura militar.
As
consequências da crise econômica no Brasil e o mal estar causado por ela em
toda população também tem sido utilizada pela oposição para engrossar as suas
fileiras, pois atribuem à gestão do PT e à corrupção de seu governo o motivo da
crise. Muitos têm caído nesse discurso, inclusive muitos trabalhadores. Como
apontado anteriormente, a crise econômica tem outras causas, e todas as frações
da burguesia, seja governista, seja da oposição vão tentar administrá-la
atacando as condições de vida dos trabalhadores. Assim, não faz sentido algum
apoiar as bandeiras genéricas levantadas pela oposição como o combate à corrupção
e impeachment, ou defendendo uma ditadura da burguesia aberta com o retorno dos
militares ao poder.
Os governistas tentaram esboçar uma reação ao
convocar as centrais sindicais às ruas no dia 13 de abril de 2015. Porém, o que
ficou claro foi que o PT perdeu a base social que lhe deu sustentação nos
últimos 30 anos, e o movimento deste dia se mostrou esvaziado e artificial, com
participantes afirmando terem recebido dinheiro para participar das
manifestações, além da ausência de grande parte da classe trabalhadora que não
mais se sente representada pelos sindicatos, sejam eles ligados ao governo
atual ou não.
Os
partidos burgueses são a expressão política da própria burguesia. O PT,
enquanto partido burguês, não poderia
ser a expressão de outra classe. Não importa o quanto um partido burguês
se apresente, ou pretenda representar a classe operária e os trabalhadores em
geral, a sua política, que é a expressão dos anseios da burguesia, estará
sempre na direção contrária da classe que pretende representar.
É
neste sentido que o jornal Faísca propõe ao conjunto dos trabalhadores uma
firme tomada de posição para combater as investidas do capital, dizendo não a
TODOS os partidos e organizações atrelados ao Estado que insistem em enganar os
trabalhadores ao propagandearem que a única possibilidade de mudança da
sociedade é por meio do Estado. Defendemos a auto-organização dos trabalhadores
contra o capitalismo e o seu Estado e a perspectiva da construção de um mundo
verdadeiramente humano e socialista.