segunda-feira, 6 de julho de 2015

R$ 2,80, NÃO!!!


Fotógrafo: Victor Paiva
Mais uma vez a população conquistense é surpreendida com um aumento descabido no valor da passagem do ônibus coletivo da cidade. Na última quinta-feira, 25 de junho, o Conselho de Transportes de Vitória da Conquista aprovou mais um novo aumento da tarifa: a passagem que custava abusivamente R$ 2,40 passou a custar hediondamente R$ 2,80. É o segundo aumento em menos de um ano, pois em novembro do ano passado, a prefeitura, responsável pela administração do transporte coletivo, elevou a tarifa de R$ 2,10 para R$ 2,40. É importante salientar que o Conselho de Transportes é composto na sua maioria por representantes das Secretarias do governo municipal; representante dos conselhos de bairro; pelos donos das empresas; por sindicatos patronais e de categorias ligadas ao transporte (Sindicato dos taxistas e dos rodoviários), que em conluio se uniram contra a população trabalhadora desta cidade, maior usuária do transporte coletivo, e aprovaram direta e indiretamente o aumento da tarifa que, somados o do ano passado mais o atual, já ultrapassa os 30%.


O Conselho Municipal de Transportes afirmou que o aumento é necessário para manter a saúde econômico-financeira das empresas de transporte público que atuam na cidade (Viação Vitória e Cidade Verde), ou seja, para que as contas bancárias das empresas que exploram o comércio do transporte coletivo mantenham-se saudáveis, os trabalhadores devem permanecer enfermos vendo seu sangue ser sugado por parasitas que tratam a mobilidade urbana como fonte de lucro. Isso deixa bastante evidente o papel subserviente do poder municipal para com o capital, pois basta as empresas reclamarem que sua já elevada taxa de lucro está abaixo do desejado que a prefeitura e os representantes da burguesia rapidamente tentam corrigir o problema sangrando o bolso dos usuários dos ônibus para deixar as empresas mais satisfeitas. São os interesses das classes capitalistas que determinam os rumos dos transportes na nossa cidade e são eles que se beneficiam de seu funcionamento. Vale lembrar que a cada ano que se passa fica evidente que as promessas de melhoria no transporte coletivo não passam de engodos, pois os serviços não melhoraram em nada. Ainda utilizamos ônibus reformados e, principalmente, lotados nos horários de pico, com funcionários mal remunerados e, consequentemente, insatisfeitos em suas atividades.

O transporte público no capitalismo é transformado em mercadoria, serve à lógica irracional da ganância pelo lucro das empresas concessionárias. Assim, o deslocamento dentro das cidades transforma-se em um produto comercializado, marginalizando os interesses populares. O transporte coletivo, cada vez mais, exclui os trabalhadores e a população do direito de irem ao trabalho, irem à escola, ao médico, ao lazer ou de exercerem o seu direito de ir e vir sem uma catraca para impedi-los. Aliás, o direito de ir e vir, tão sagrado para a burguesia, é sistematicamente negado àqueles que não têm dinheiro para exercê-lo. Cada vez mais o transporte transforma-se em controle social, privando o grosso da população de transitar em determinados locais, dias e horários. A liberdade de locomoção pelo espaço urbano é fundamentalmente definida de acordo com a organização de classes presentes em nossa sociedade. Dessa forma, quem tem mais dinheiro, obviamente os donos dos meios de produção, movimenta-se mais e melhor, enquanto aqueles que têm menos, a classe trabalhadora, pouco se movimentam e fazem isso da pior forma possível. Isso quando não estão completamente imóveis, presos nas periferias das cidades por não conseguirem pagar os altos custos das tarifas.

A carestia dos meios de transporte coletivo agrava ainda mais a atual crise das cidades brasileiras, que se encontram cada vez mais entupidas de carros acostumados a levar um único passageiro por automóvel. Os congestionamentos tomam cada vez mais o escasso tempo livre dos trabalhadores no deslocamento de suas casas ao trabalho, ampliando cada vez mais a sua jornada de trabalho. Vivemos sob uma forte ditadura do mercado onde as empresas automobilísticas (entre outras), com gordos incentivos do Estado, ditam as regras e controlam o espaço público.

Como se não fossem poucas as dificuldades para se organizar e conseguir condições melhores de vida, os trabalhadores e estudantes se deparam com falsos amigos do povo, entidades oportunistas, mas que tem como objetivo único e exclusivo manipular qualquer  iniciativa autônoma dos trabalhadores e estudantes contra as infames medidas dos governantes. Em 2005, a prefeitura de Vitória da Conquista anunciou que o preço da passagem dos ônibus seria elevado de R$ 1,00 para R$ 1,20. Antes mesmo  que o aumento fosse posto em prática, milhares de estudantes tomaram as ruas da cidade para lutar contra a medida. Estas manifestações ficaram conhecidas como R$ 1,20 NÃO! Sem demora, a União da Juventude Socialista (UJS), organização ligada ao PCdoB, tentou se apoderar do movimento. Daí em diante a UJS impediu o acesso ao microfone de quem não fazia parte dos seus aliados, além de contribuir e aplaudir a prisão de manifestantes pela polícia e, após uma semana de manifestações, sem o consentimento dos manifestantes, fechou um acordo de aumento parcelado da tarifa com a prefeitura, na calada da noite e a portas fechadas. Por mais inflamados e radicais que sejam no discurso, na prática sempre vão buscar alguma forma de levar os manifestantes a conciliar com os governos petistas. Essas entidades, que não se restringe somente a UJS (o Levante Popular da Juventude, grupo que possui afinidades com o PT, também possui práticas semelhantes), acabam convertendo-se em novos agentes da disciplina social.

Nesse processo se destaca também o papel de vilão dos sindicatos, que às escondidas com os patrões tentam manipular os trabalhadores do setor de transporte. É comum que os próprios patrões incentivem os dirigentes sindicais a provocar paralisações em defesa das pautas históricas do movimento, como, por exemplo, melhores salários, e por se tratar de uma reivindicação válida tem o apoio do conjunto dos trabalhadores. Porém, a empresa acaba usando as exigências de aumento salarial dos rodoviários como justificativa para aumentar o preço das passagens, em uma manobra que busca colocar os funcionários contra a população que utiliza o serviço. Estas experiências históricas demonstram que é preciso sempre desconfiar daqueles militantes profissionais que buscam conquistar a liderança do movimento, declarando ser representantes legítimos dos trabalhadores.

Diante disso, o transporte coletivo e seu atual quadro de crise tem um caráter eminentemente político, pois é o poder econômico dos empresários que ditam as regras na esfera do poder público municipal, e fazer frente à prefeitura, ao Conselho de Transportes e às empresas de ônibus por meio da organização autônoma dos trabalhadores e da juventude é o único caminho. Devemos buscar formas de decisão popular que ultrapassem as esferas controladas por essas caducas formas tradicionais. As assembleias podem ser um bom exemplo pois, nelas, cada um de seus membros pode falar, propor e votar. Desta maneira, os trabalhadores e estudantes podem evitar as tentativas de manipulação promovidas pelos militantes oportunistas vinculados aos partidos políticos e aos sindicatos. Além do mais, a ampliação da participação política nestes espaços de decisão promove a auto educação política de seus membros, levando a tomada de consciência das massas a respeito da origem dos problemas sociais e dos meios para resolvê-los.

Uma coisa é certa, não dá mais para ficar apenas assistindo de braços cruzados os constantes ataques do capital contra os trabalhadores. Não podemos confiar no Estado, pois este não passa de um mero representante político dos interesses das classes dominantes (nacional e internacional). Enquanto não nos auto-organizarmos para reagir a estes ataques seremos um alvo fácil para as elites capitalistas. Esta é uma batalha que está apenas começando. Com a crise econômica se aproximando, a burguesia tentará a todo custo empurrar para os trabalhadores a conta de seus prejuízos. Precisamos nos preparar desde então para este cenário político, pois apenas os trabalhadores podem dar um basta à ganância capitalista que está levando o planeta inteiro ao colapso.

É necessário, em primeiro lugar, demonstrar toda a insatisfação com essa situação e tentar fazer a prefeitura recuar, exigindo a revogação imediata do aumento da tarifa de ônibus. Porém, para além desta necessidade urgente, é preciso levantar um debate muito mais amplo acerca da mobilidade urbana. Atualmente existem muitos grupos políticos discutindo intensamente a possibilidade da TARIFA ZERO por defender que o custeio do transporte público deve ser dos capitalistas que exploram a classe trabalhadora; que as catracas devam ser extintas. Há de se criar novas possibilidades recusando a natureza mercantil do transporte público. A luta pelo direito ao transporte configura-se em lutas contra a existência da tarifa, mas também melhorias na qualidade e ampliação do serviço. Os meios de condução precisam ser vistos como um direito essencial aos trabalhadores e de seus filhos, não como uma mercadoria a ser consumida. Todavia, sabemos que esta discussão precisa ser amadurecida, principalmente se levarmos em consideração os limites estruturais impostos pelo sistema capitalista.

O espírito de indignação toma conta da população trabalhadora e estudantil de Vitória da Conquista que se sente de mãos atadas diante de tamanho descaso de seus ditos representantes. Chegou a hora de tomar de volta o poder de decidir sobre nossas vidas. Chegou a hora de dizer NÃO aos abusos dos políticos e empresários. Vitoria da Conquista, com seus trabalhadores e estudantes, deve dizer BASTA a essa situação e, de imediato, repudiar o aumento da tarifa do transporte coletivo. R$ 2,80 NÃO!!!

* O presente texto foi elaborado pelo grupo de discussões que edita o Jornal Faísca e representa o consenso da maioria dos seus participantes.